Ct 003 - Morro Alegre

Num vale surgido entre montanhas, a cidadezinha destacava-se; ao sul, a aproximadamente três quilômetros do centro, havia uma cadeia de montanhas com cumes elevados e totalmente rochosos. A mata recobria sua encosta, demonstrando nela toda variedade daquela vegetação serrana.

Entre dois grandes rochedos, que formavam paredões juntos aos cumes mais elevados, uma cachoeira mostrava seu véu, provindo deles um riacho. Do outro lado, em semicírculo a esses elos montanhosos, víamos altas colinas. 

Olhadas ao largo nos davam a vista de montanhas; mas, eram apenas colinas altíssimas, e tinham em seu sopé algumas minas d'água; estas formavam nascentes e originavam um segundo riacho.

Quando ali chegávamos por terra, ultrapassando uma pequena ponte de madeira sobre um rio caudaloso, bem ao alto das colinas um mirante possibilitava a observação da cidade circundada por outro rio. Desses dois pequenos riachos formava-se o Rio Estreito. Sua vazão era forte após a junção dos riachos; mas, mantinha-se num leito estreito, em parte porque as matas ciliares estavam preservadas e também porque o fundo do rio era pedregoso.

A região possuía um fluxo turístico constante em razão do clima serrano, das suas águas termais e por localizar-se a uma curta distância da capital. Inúmeras chácaras circundavam a cidade empregando muitas pessoas. O turismo também movimentava o comércio local e mantinha a construção civil em expansão. 

Havia uma grande contradição em curso nestas atitudes. A procura pela região era vinculada às condições climáticas, para as quais a preservação do meio-ambiente é imprescindível; entretanto, para instalarem lá suas casas de campo procuravam pela construção civil, forçando com isto a extração clandestina de areia e pedra dos leitos dos rios, afetando-os em demasia. Ainda assim, por força da legislação e fiscalização ambiental, os habitantes das chácaras que havia entre a cidade e os riachos esforçavam-se em manter a mata ciliar conservada, colaborando assim para a preservação do Rio Estreito.

Quem lá chegava supunha estar numa pequena planície, pois, pela estrada de Serra Bonita, a qual acompanhava a sinuosidade das montanhas, notava-se a cidade num plano ao fundo do vale formado entre as colinas e as montanhas. Mas, era apenas a primeira impressão – e esta não ficava – contrariando o dito popular de que a primeira impressão é a que fica. Quando se andava pela cidade, percebiam-se mudanças no tipo de solo e as suas acentuadas subidas e descidas; assim, a planície que se anteviu, à distância, desaparecia dos pensamentos. Nem sempre o que se antevê é real; quando defrontada com a realidade aquela noção preliminar desaparecia por completo. E então, o que se esperava mostra-se como uma grande ilusão em face da realidade.

Uma placa na entrada da cidade, suspensa por correntes entre dois enormes postes de madeira, anunciava "Bem-vindo a Morro Alegre". Seguindo pela via principal, as ruas surgiam em certo desalinho, testemunho da historicidade do seu casario antigo.

O carro que Luiz conduzia trepidava acompanhando a irregularidade da pavimentação precária da cidade em que chegava. Avistava-se ao longe a torre duma igrejinha e as copas de algumas árvores. Uma brisa suave descia das montanhas, tornando a manhã úmida e fria, e o Sol ainda trazia pouca luz ao início do dia. Ele dirigiu pela noite toda para chegar de manhã em Morro Alegre; mesmo jovem, a falta de repouso aplicou em seu corpo um cansaço além do costumeiro.

Aos trinta anos, Luiz despendia toda a energia em suas metas profissionais, sem poupar esforços. Mirava num alvo e perseguia-o com tenacidade até atingi-lo. Vender era a sua grande felicidade profissional; havia cursado faculdade de Urbanismo e, todavia, encontrou nas atividades de vendas um enorme senso de realização. Acreditando no próprio potencial, concluía: "De que adianta buscar meus objetivos se não empregar até minha última energia em concretizá-los?" 

Com essa diretriz, avançou dia após dia atendendo suas praças de vendas e a esforçando-se para abrir outras novas, sendo este o motivo que o levou até Morro Alegre. Como representante de distribuidor de tintas, na região em que observava a construção civil em expansão ele focalizava excelentes oportunidades de negócios. Assim, o alvo hoje era aquela cidade. Nos últimos meses expandira em vinte cidades a sua área de vendas, tal era sua determinação.

Por alguns instantes, Luiz lembrou-se das aulas de urbanismo; desde o início da invasão portuguesa ao solo brasileiro e até por volta de 1960, as cidades e vilarejos formavam um centro ao redor de uma igreja. "Lá onde está aquela igreja pode ser o centro; e deve ter alguma lanchonete aberta!" Assim pensou Luiz, que lá chegava perturbado pelo apetite matinal. Seguiu ao centro encontrando uma enorme praça, dessas voltadas à boa conversa. As árvores daquela praça, exuberantes em suas folhagens e orgulhosas em seus galhos, nos possibilitam dadivosas sombras durante todo o dia, tornando sempre agradável parar um pouco e buscar "dois dedos de prosa com o amigo" como se diz naquele recanto.

Entre as mãos Mônica trazia alguns embrulhos; fora logo cedo a uma loja de presentes, ansiosa em surpreender a mãe com um belo guarda-chuva. A sua mãe era a aniversariante da família naquele dia e Mônica, cuidadosa, em cada data de aniversário de algum familiar providenciava o necessário presente. A alegria da aquisição – e em saber que ela faria alguém feliz pela lembrança – tomava toda a sua atenção. Aproveitara a ocasião também para outras compras. Apesar de bem trajada num vestido estampado claro, colado ao corpo, a visão duma bonita calça jeans alimentou seu desejo de compra.

 Começou pelo guarda chuva, passou pela calça e chegou a uma presilha, que agora enfeitava seus cabelos aloirados detrás da cabeça. Chovera de madrugada e isto a fez pensar num presente útil à mãe. Porém, o dia amanheceu afastando as chuvas e principiou ensolarado. Ela atravessaria a rua, enquanto o sol brilhava em sua direção; pouco via o que tinha logo à frente. Imaginava nesse entremeio o quanto a mãe ficaria feliz com o presente. Os volumes tomavam suas mãos e tiravam um pouco da visão. Desatenta, colocou os pés logo abaixo do meio fio, iniciando a travessia.

Luiz vinha devagar; tranqüilo o suficiente para observar a linda garota que tentava atravessar a rua. Quando ele viu suas coxas torneadas e coladas ao vestido, diante do carro, freou o carro abruptamente, evitando o atropelamento iminente; porém, a parada brusca sobre uma poça d'água lançou um jato enlameado sobre a moça. Ao barulho da frenagem e ao som da água atingindo o corpo dela, bem como ao lindo rosto ruborizado e assombrado da moça, Luiz sentiu uma enorme vontade de dar risada. Não conteve totalmente a gargalhada que lhe saiu lacônica e acabou mantendo um sorriso amarelo para a moça. Ela olhou-o com todo o ardor juvenil, ansiosa em retaliar aquele sorriso com fortes palavrões; — Escute aqui! Você estava tentando me atropelar? Não viu que eu atravessava a rua? Você vai acabar matando alguém, seu barbeiro!

Um ligeiro suor corria pelo rosto de Mônica, ainda que não estivesse tão quente naquela manhã. A situação a enervara o suficiente para começar a transpirar fora de hora. Luiz continuava querendo rir da situação. Via à sua frente uma linda moça, ferida em seus brios pela lama que a atingiu, enquanto ele divertia-se pelo inusitado daquela situação. Em suas andanças, ainda não se deparara com uma figura tão especial aos seus olhos e numa cena tão inesperada. 
— Desculpe-me, por favor! - disse ele - Não queria que isto acontecesse... Bem poderíamos nos conhecer noutro lugar... E em outra situação! 

Tal galanteio não aliviou o nervosismo da moça. Então ele continuou, logo em seguida. 
— Por favor, entenda que não tive a intenção de te molhar. Você veio pra cima do carro e eu parei o mais rápido que pude! Ou você queria que eu te atropelasse para não molhar teu vestido?

Ele recomeçava a esboçar um ligeiro sorriso, pondo fim ao tom diplomático em que procurava contornar um possível conflito com as nervosas forças da loira. O último sorriso dele, ainda que sutil, a enraivecera o suficiente para que ela lhe respondesse energicamente. 

— Porque não vai dar risada da tua mãe, seu cretino filho da puta!

Com a resposta agressiva, após Mônica pegou os embrulhos que lhe caíram ao chão no momento do susto, saiu apressadamente do local. Luiz continuou a observá-la; o delicado perfume dela permaneceu no ar por mais alguns segundos e nas fantasias dele por um tempo muito maior.

Seguindo seu caminho, Luiz chegou à lanchonete onde tomaria seu desjejum. A Lanchonete do Zé Pedro projetava seu telhado numa pequena área em frente ao prédio, onde havia mesinhas para atender aos clientes. O telhado acompanhava o estilo colonial predominante na cidade e, ainda que as telhas da área não fossem da mesma qualidade das que havia no telhado original, o desenho delas trazia ao Pedro a sensação de que a cobertura era uniforme. Naquele seu ambiente, Zé Pedro era o anfitrião mais solícito, e também o mais íntimo amigo, para os que lá fossem provar dos seus quitutes.

Luiz mantinha a atenção dividida entre pães, café e uma conversa modesta com Zé Pedro, não deixando de notar as teias de aranha que acompanhavam as ripas do telhado. Toda essa dispersão aparente escondia o que em seu interior sucedia. Naquela comunidade pequena, um representante comercial – ou viajante como lá dizem – , torna-se facilmente alvo de indagações. Zé Pedro o inquiria das mais diversas maneiras. 
— Moço polido como o sinhô deve de procurar alguma coisa nessas terras, né mesmo? Preocupe não... Tem tempo, sô! Aqui pertinho, num tirinho, tem uma pensão das boa. Se ficar treis dias, conhece di tudo! Cê vai vê que trem bão é isso aqui! E nóis fica aqui inté morrer... e alegre! Morro Alegre...é desse nome di porpósito!

O sotaque traduzia o espírito daquele hospitaleiro povo. A linguagem lenta e comedida, pela qual ganhava tempo para "cercar o José", no caso chamado Luiz, implicava em sondar o visitante; aos poucos o perguntador descobriria até os mínimos detalhes do objetivo do visitante. Pode-se dizer que Pedro aplicava aquele velho provérbio popular "com calma e jeito, mesmo ao viés, eu acho o do sujeito!". 

Porém, a sabedoria popular não contempla, nesse caso, o interior de Luiz que mergulhava fundo nas lembranças do incidente que acontecera na sua chegada. Diante disso, as respostas de Luiz eram um tanto vagas; Pedro perdeu o interesse, afastou-se da mesinha e resmungou baixinho. O que ele disse Luiz ficou sem ouvir; mas, para nós que soubemos da estória depois, aqui está: — Esse peão tá mangando di eu! Não respondeu nada com nada! Sei não...

Luiz tomou seu café da manhã e pôs a atenção no comércio que ocupava boa parte da praça central. Para ele, nada era tão estimulante quanto prospectar, iniciando novos contatos que podem resultar em vendas imediatas ou num futuro próximo. Com total atenção ao objetivo que o trouxe até Morro Alegre, concentrou-se e começou a trabalhar, deixando para mais tarde a recomendação de Pedro para que buscasse hospedar-se. 

Visitou alguns pequenos comércios, realizando algumas vendas e contatos para futuras vendas; faltava ainda seguir a indicação de Pedro, que lhe falara sobre um grande estabelecimento. Pedro dissera-lhe que aquele era o maior. Luiz não deixaria de visitá-lo.

Ao largo da praça central, já em seu prolongamento, havia a grande loja de materiais para construção que Pedro indicara-lhe. Placas em acrílico na entrada anunciavam promoções e, dentre elas, uma chamou a atenção de Luiz porque se tratava de tintas. Em sua carteira de vendas possuía os mesmos produtos e em preços altamente competitivos. 

Chegou próximo ao balcão, observando a diversidade de materiais que ofertavam e solicitou ao caixa para falar com o responsável pelas compras; não notara que num mezanino à sua esquerda havia um pequeno escritório, onde em sua porta constava num cartaz: "Atendimento a Vendedores: das 9h às 12hs - somente nesse horário. Não insista!". 

Num espaço onde vendedores aguardavam, uma mesinha com café e um bebedouro eram usados, enquanto esperavam pela gerência. Luiz resolveu também aguardar; sentou numa das poltronas e contou com ele oito pessoas. 

Eram cerca de dez horas e não começaram a atender; imaginou que conseguiria ao menos apresentar-se hoje. Assim ele pensava, quando começou a suar frio.

O rapaz do caixa saudava alegremente uma alta moça loira, acompanhando outros funcionários que também a cumprimentavam. A todos ela respondia com elegância e simpatia, integrando-se com o ambiente. Notava-se o quanto ela era bem quista naquele local. Sua simpatia e simplicidade aparentemente cativavam a todos que ali trabalhavam. 
— Bom dia, Mônica!, - Disse o rapaz do caixa -, hoje tem um novo vendedor nessa turma! Ele disse que trouxe boas opções em preços de tintas!

Luiz não conseguia sequer levantar-se direito do sofá. Desconcertado, reconheceu-a de imediato, apesar de que agora usava um outro vestido, dessa vez em rosa. Luiz era hábil em práticas comercias; entretanto, o sobressalto em reencontrá-la causou-lhe um certo embaraço. Não esperava revê-la, muito menos diante do início de uma relação comercial. No entanto, ele procurou se recompor.

Ela disse ao rapaz que lhe avisara sobre Luiz: 
— Olha só... Atrasei-me por causa desse sujeito! Depois te conto... Ele chegou por último, não é? Mas, eu o receberei logo que puder...

Luiz resolveu aguardar, enquanto observava as reações de cada um dos representantes que saíam da saleta. Ele assemelhava-se a um voraz pesquisador sondando o território. Notou que os rostos oscilavam entre alegres e tristes; e isto, em sua abordagem, mostrou-lhe que as vendas eram boas para uns e desoladoras para outros. 

Ele ficou atônito diante da possibilidade de um fiasco nas vendas, caso a zanga dela proveniente do incidente interferisse. Os argumentos para vender os produtos giravam em sua mente. Tinha por objetivo preparar-se para demovê-la de qualquer possibilidade de negativa que não fosse puramente comercial.

Restavam duas pessoas para Mônica atender. Chamou o penúltimo, deixando Luiz sozinho da recepção de seu escritório. O horário já extrapolara em meia hora, enquanto ele impacientava-se um pouco mais. Uns dez minutos após, Mônica sai da sala e fala energicamente a Luiz. 

— Você é o rapaz daquele banho de lama... Numa infeliz coincidência, me atrasou em demasia. E por isso o horário avançou... Amanhã poderei atendê-lo. Deixe comigo seu cartão de visita; se quiser ser atendido, deve voltar amanhã!

Luiz pôs os pensamentos em ordem e respondeu-lhe serenamente: 
— Não há problema algum! Ficarei mais dois dias em Morro Alegre. Pretendo conhecer todos os locais que comercializem produtos da linha que represento; se for possível conversarmos, será ótimo! Tua loja é significativa nesta cidade e acredito que poderemos fazer bons negócios. Eu voltarei amanhã, com todo prazer!

Despediu-se e foi embora, continuando em busca de outros clientes. Mônica respirou aliviada; o incidente matinal ainda estava vívido em sua mente. Não desejou prejudicá-lo; mas, os fatos pesaram mais do que qualquer discurso ou sentimento prévio. Havia condições para o atendimento vinculadas ao horário; e ela não poderia desconsiderá-las, porque afetaria o resultado de outras tarefas suas.

Luiz achou a chance de voltar amanhã importante, considerando que nada iria interferir na prática de seus serviços de representação comercial. No decorrer da tarde, o olhar fixo e determinado com o qual Luiz lhe falou manteve-se na memória de Mônica. Por conta disto também se lembrava com exatidão a roupa que ele usava, bem como a firme disposição com a qual ele manifestava-se. Algumas das palavras dele estavam soltas nos seus pensamentos. "Se for possível conversarmos será ótimo!" e “Será que ele pretende se desculpar?”; essas dúvidas dominavam o seus pensamentos.

Ela havia conquistado a duras penas a posição que atingira em seus negócios, afastando-se até mesmo de amigos. Restou-lhe por fim a família, onde se esmerava em zelos. Agora, um estranho aparece banhando-a em lama, para depois impressioná-la profundamente. 

Tudo o que ela não desejava era que ele viesse pedir desculpas; depois do primeiro momento, ela estava ciente de que se tratara dum incidente sem maiores consequências. Desejou, por fim, que Luiz reaparecesse e não pedisse desculpas, relevando aquele fato. Afinal, ela não se alegrava nem um pouco em lembrar do banho de lama matinal.

Depois de almoçar na Lanchonete do Zé Pedro, Luiz passou a tarde em busca de diversos clientes; estafado ao final do dia, procurou por uma pousada e lá descansou naquela noite. Em sonhos suaves, achou-se como morador de Morro Alegre, onde toda a beleza do local fundiu-se a Mônica; viu nas curvas do riacho as próprias da cintura de Mônica, enquanto aquele azul claro do olhar dela espelhava o amanhecer. A sua tez avermelhada, associando-se ao Sol poente, mostrou-se ainda mais valorizada em seus sonhos.do que presenciou. Viu em seus cabelos os tons do Sol refletindo a pele dela, a qual adivinhou macia e exalando peculiar aroma tal qual sentiu pela manhã.

A voz dela ainda repetia-se em sua mente, conjuntamente ao borbulhar das águas do Rio Estreito, que gentilmente o recepcionou quando chegou a Morro Alegre. Ao amanhecer, abriu os olhos ciente de que se apaixonou por um local e por uma mulher, ambos especialíssimos ao seu coração, tal foi o impacto do sonho que teve em seu coração.

Chegou até a loja de Mônica da mesma maneira que no dia anterior, porém, com bastante antecedência. Fora o primeiro a comparecer e sentia-se como um adolescente diante de um primeiro encontro. O profissional questionava o pessoal, no exato instante em que ele a viu. A visão que ele teve dela foi fantástica; pareceu-lhe como uma rainha. 

Ela entrara da mesma forma que no dia anterior, porém, apenas o cumprimentou com um aceno e depois se trancou na saleta. Luiz ouviu a porta fechar-se e assombrou-se. “O que devo fazer nesse momento? O que exatamente me trouxe aqui? Estou confundindo os assuntos?” Estes questionamentos poderiam tornar suas atitudes incertas.

Resolveu agir com forte fé no próprio discernimento e esperou com ansiedade pelo chamado dela. Estava convicto que saberia administrar os dois assuntos, certo de que ao mínimo descuido perderia um cliente e a chance de aproximar-se dela. Não poderia errar; o instante era para total atenção e empenho, porque não desejava ser um profissional corrompido pelas emoções.

Mônica abriu a porta; olhando para a saleta, notou que Luiz estava só; naquele momento, não havia mais ninguém à sua espera além dele. 
— Oi... Venha pra cá... entre e sente-se aqui. - Indicou-lhe uma poltrona em frente à sua mesa, enquanto fitava-o nos olhos.

Ele começou a suar frio totalmente intimidado pelo olhar fixo dela. 
— Oi, bom dia! Finalmente poderemos conversar! - disse ele. 
— Hoje teremos um bom tempo para que você possa expor sobre teus produtos, bem como das condições que poderá nos oferecer.

A fala dela foi direcionada ao assunto que o trouxe a Morro Alegre. Ele sentiu-se aliviado e mais seguro, logo demonstrando seu catálogo e falando das condições para a venda. Nesse ínterim, observavam um no outro as qualidades pessoais e em suas mentalidades, no mais profundo delas, admiravam-se. 

Passada meia hora eles haviam efetuado negócios que cada qual julgou bom para si próprio. Já ao final, com tudo resolvido e pedidos tirados, Luiz olhava-a nos olhos demoradamente. Observou Mônica - a pessoa dela -, e não mais a profissional que o atendera; com voz alegre e espontânea, demonstrando carinho, disse a ela:
 — Vim até Morro Alegre para abrir um nova praça de vendas, e estou muito feliz! Além de conseguir estabelecer um bom número de clientes, vi que tua cidade é maravilhosa! Nunca vi tanta beleza reunida! Preciso ir embora, temendo que este local, inigualável em vitalidade e beleza, possa prender meu coração!

Ela já havia levantado da cadeira e aproximou-se pretendendo despedir-se dele; durante todo o tempo manteve-se imperturbável para atendê-lo; todavia, com essa última afirmação sentiu-se despida, em seus pensamentos, pelo olhar dele.

Caiu um silêncio no qual os olhares, fixos um no outro, diziam muito sem palavra alguma. Ao chão que faltava às pernas de Mônica e às faces que coravam, os corações agora disparavam.

Ambos sorriram e aproximaram-se ainda mais. Luiz tocou o rosto de Mônica com uma das mãos e o acariciou; em seguida ele juntou seus lábios aos dela num esperado beijo apaixonado.