Cr 016 SobreViver

Minhas lembranças da cidade de São Paulo são curiosas. Lembro-me de um sujeito, em 94, numa passagem que tive pela Praça da Sé. Logo pensei que ele fosse um pouco perturbado! Clamava aos céus por misericórdia, anunciando o fim dos tempos e balançava no ar possivelmente uma bíblia, dizendo que ali estava escrito que tudo irá acabar em fogo, em água, que os ventos irão a tudo destruir, que a terra irá tremer e a todos soterrar. 

Muitos são os textos antigos de natureza apocalíptica e eles têm um ponto em comum: a preocupação com o incerto destino que a Humanidade, num comportamento irresponsável, vem determinando ao ambiente do planeta e, nas suas “visões”, preveem todo o tipo de destruição que a tecnologia disponível na época em que o autor da profecia existiu.

As pessoas, dispondo para suas observações apenas dos quatro elementos - terra, água, fogo e vento - em seus estados originais, deles tomaram reflexões atribuindo o Bem ou o Mal em conformidade com a perda ou ganho que as ocorrências naturais geravam em suas vidas. O conceito de "Castigo Divino" surgiu posteriormente, quando as pessoas atribuíram sentimentos humanos ao conceito de um Deus antropomórfico, tais como amor e ódio. Então, as profecias passaram também a ser “castigo ou recompensa”, de acordo com o sentimento atribuído àqueles que compartilham ou não da mesma fé do profeta.

Revi a cena presenciada em 94 na Praça da Sé, em São Paulo, e juntei a ela a imagem do Pátio do Colégio, considerado marco histórico da ocupação europeia intra-continental e início da capital paulista. Daquele momento em diante os povos imigrantes da Europa fixariam-se neste local, surgindo o que seria denominado de país Brasil e, ainda mais tarde, uma nação.

O que é hoje um brasileiro? As pessoas que habitam este território já possuem características semelhantes, dentre a diversidade cultural e étnica neste território chamado Brasil, para que os sociólogos concluam que existe, de fato, uma nação brasileira? Em todo caso, o conceito nação supõe alguma identidade cultural.

Imenso e multifacetado culturalmente é este território que habitamos; se há ou não uma nação brasileira é pergunta pertinente aos estudiosos da área. Mas, o que quero relembrar: antes da invasão dos europeus, existiam mais de duzentas nações; e, segundo historiadores, a população estimada do que é hoje o Brasil era mais de noventa milhões e, portanto, dez vezes maior do que a população de Portugal na época do início da invasão europeia a este continente.

Seguindo a tendência de extermínio dos povos, verificada entre os séculos XVI e XVIII, para os povos pré-colombianos o séculos seguintes foram marcados pela aculturação; resultou que a eles impuseram novos conceitos em religiosidade, alimentação e outros aspectos comportamentais, destruindo-se toda uma cultura pré-existente à invasão europeia.

A verdade é que não se retorna no tempo e é impossível mudar os fatos. Nada que possamos argumentar mudará qualquer evento acontecido. Há alguma chance em mudar a história que construímos neste momento; é, todavia, alento para a preservação do que é chamado de Cultural da Localidade. É mister lembrarmos que todos os atos, costumes sociais, aspectos artísticos, ou melhor: o comportamento humano, é a fonte do que é chamado “Cultural”.

Temos um vasto arsenal nuclear espalhado por muitos países, e a Juréia, aqui próximo, quase foi palco de uma usina para geração de energia atômica; do uso de material nuclear, para fins energéticos (essa era a proposta divulgada) é fácil migrar para a tecnologia de reatores que enriqueçam o Urânio, possibilitando-lhes o uso em ogivas nucleares. Ufa! Passamos perto...

E agora, quando a ação do Estado em criação de superestrutura é esgotada, a região que outrora abrigaria tecnologia de ponta, na área nuclear, não dispõe sequer de empregos no setor primário, carecendo de obras básicas de estruturação para gerar um ciclo econômico ascendente e sustentável. O bom é que se preservou o ambiente natural e, espero, as pessoas com as suas culturas locais.

Achei, num evento aleatório, um "Currículo do Atleta" (sic); nele, produto dum erro na digitação, a ano de nascimento do Atleta era o de 19991(sic). Não, não se trata de um "Currículo Pré-Datado", a exemplo da costumeira prática social atual de emissão de dívidas pré-datadas, digo, cheques pré-datados.

Daqui a 30 ou 50 anos este planeta conseguirá sustentar a vida, tal como a conhecemos? Ou não honraremos nossas contas, depredando a herança ambiental que recebemos dos nossos avós, nele incluindo a cultura, deixando um Patrimônio muitas vezes menor aos netos, apenas dezoito anos à frente? 

É necessário preservarmos, pelo menos em parte, a herança das condições de vida que os povos anteriores nos deixaram, sem lançarmos demasiados cheques pré datados de liquidação duvidosas contra o banco da vida, o ambiente em que vivemos.

Mortalmente ferido em suas fontes de criação e manutenção da vida, o Planeta Terra chora... Os profetas de plantão anunciam, face a tecnologia disponível, desastres nucleares e o surgimento de líderes insanos que colocam nações em guerra.

Os povos que habitavam, há apenas cinco séculos atrás, este querido solo iguapense viviam, presumidamente, em melhor integração com o meio ambiente, tornando possível o equilíbrio entre as espécies,

Tudo é apenas transitório e a impermanência da vida é fato inquestionável, sujeita ao ciclo do surgimento, plenitude, velhice e morte. Assim também é a vida neste planeta, tal como a conhecemos. Porém, não precisamos acelerar o ciclo!

Criando condições ruins para sustentar a vida, em suas possíveis manifestações e diversidades, podemos abreviar o ciclo e condenar à morte os seres vivos deste planeta.

Avançar num caminho onde as pessoas e seu ambiente natural sejam respeitadas em suas próprias características manterá o mundo pacífico e evitará catástrofes naturais.

Julho/2007